Monday, January 31, 2011

O Centro de Estudos Matemáticos do Porto numa carta de Abel Salazar a Celestino da Costa de 1942, ano da fundação do CEMP


Prof. Celestino e meu caro amigo

Veio hoje aqui o Ruy participar-me, radiante, a criação do Centro de Estudos Matemáticos, que julgamos é obra sua.
O Ruy vinha feliz: e, realmente, poucas coisas tão limpas e acertadas se têm feito entre nós, sem pedidos, sem empenhos, espontaneamente.
Efectivamente, nos últimos tempos, com raro tacto, o Ruy começou a animar a secção de Matemáticas e esta obra está dando já frutos. O esforço dele tem-se dirigido no sentido da actualização e mise-au-point das mais modernas teorias matemáticas, bem como das teorias fisíco-matemáticas, incluindo a Relatividade de que o Ruy é um especialista distinto, já conhecido lá fora; e, por outro lado, no sentido de animar, interessar a gente moça no actual momento matemático e físico-matemático. Tenho assistido a algumas reuniões, por curiosidade e realmente aquilo começa a viver, e é um começo de «vida universitária».
A secção de Matemáticas — deve-se dizê-lo — tem-no ajudado com inteligência e com interesse, o que já não é pouco.
Por todas estas razões nada podia cair melhor nem causar maior prazer e estímulo do que a criação do Centro de Estudos Matemáticos, e se isto é obra sua como se suspeita aqui, deixe-me abraçá-lo muito alegremente! Porque é tão raro entre nós ver proceder com tanto interesse, tanta inteligência e tacto! Creia que não o posso lisonjear e que isto é um reflexo da alegria do Rui junto ao meu próprio contentamento.
Sinceramente esperamos que volte um dia para o cargo que dei­xou. De resto bastaria a obra do Centro de Estudos Matemáticos de Lisboa para justificar a corrente de simpatia que este incidente levan­tou em volta do seu nome. Há coisas paradoxais. Este incidente veio dar-lhe um prestígio sob todos os pontos de vista excepcional.

Receba os cumprimentos do velho amigo e admirador

Salazar

Sunday, January 30, 2011

«venho neste momento exprimir-lhe a minha velha camaradagem»: carta de Abel Salazar a Celestino da Costa de 1942

[1942 foi o ano da demissão de Celestino da Costa do Instituto de Alta Cultura]


Prof. Celestino e meu caro amigo
Soube pelo Ruy da notícia referente à Alta Cultura e venho neste momento exprimir-lhe a minha velha camaradagem.
Soube pelo Ruy ainda da primeira impressão e mesmo da grande inquietação determinada pelo facto da sua saída, que é considerada pelos meios científicos como um desastre para o nosso meio científico. Tive a ocasião de notar que a opinião é unânime a esse respeito.
Aqui no Porto a opinião é a mesma.
Receba um afectuoso abraço do velho amigo

Salazar



*


«A vida universitária sem aquilo não é nada...»: carta de Abel Salazar a Celestino da Costa de 1941

Final de uma carta de 1937 que significa "Muitos [cumprimentos] do [Abel Salazar]"

(...)
O Ruy ficou muito impressionado com a visita ao seu Instituto: — A vida universitária sem aquilo não é nada... dizia ele; «aquilo» é o trabalho de laboratório. A impressão dele foi ainda maior com o contraste feito pela visita à Faculdade de Ciências: — É horrível, aquilo! Uma coisa fóssil!
(...)

(Abel Salazar - 96 cartas a Celestino da Costa)

«Não compreendo esta fúria contra mim»: carta de Abel Salazar a Celestino da Costa de 1936



(...)
Outra coisa. Na entrevista concedida pelo Prenant ao Jornal do Brasil publicada no último número do Diabo, vinha uma referência a este seu criado. A censura cortou-a. Não compreendo esta fúria contra mim. Desde que saí da Escola tenho estado sempre metido em casa, como sempre à margem de toda a vida política, sem relações nem ligações de qualquer ordem seja com quem for.
Avisam-me porém que está no Ministério da Instrução uma nota segundo a qual eu e o dr. Caraça temos... uma célula comunista! Ora eu só há dias conheci pessoalmente aqui no Porto o dr. Caraça com quem nunca tivera relações nem mesmo por escrito! Uma célula comunista, isto é fantástico! Não há tal célula, nem qualquer ligação seja com o que for, não há nada, absolutamente nada, senão esta mania, esta fúria inventiva, imaginária, contra mim!
Mas porque razão não me sujeitam eles à sindicância que lhes propus? Porque razão recusaram a sindicância? Quem não deve não teme! Sim, que façam uma sindicância, o mais rigorosa possível; e como a Polícia até a casa me vigia, que digam um só facto suspeito que tenham averiguado! Um só! Agora assim uma constante guerra em surdina, por acusações imaginárias, falsas, é uma infâmia. É curioso que o Dr. Correia Pinto, o amigo do Oliveira Salazar, não queria acreditar que me fosse proibido ir sequer à Biblioteca da Faculdade. Disse-me que isso não podia ser... E no entanto é! Isto e muitas coisas mais. Mas porquê? Coisa paradoxal, as minhas ideias expostas em público por escrito não sofrem sequer os cortes da Censura, são pois não perigosas. De que sou enfim acusado. Chego a não perceber a causa deste imbróglio!
(...)

(Abel Salazar - 96 cartas a Celestino da Costa)

Friday, January 07, 2011

Arnaldo Mesquita (16 de Janeiro de 1930 - 1 de Janeiro de 2011)

Arnaldo Mesquita
(Lousada, 16 de Janeiro de 1930 - Porto, 1 de Janeiro de 2011)

«Em 1953 instala-se no Porto, para fazer a tropa, o que vem a acontecer em 1955. É precisamente nesse ano que é preso pela primeira vez pela PIDE durante o processo do Julgamento de Ruy Luís Gomes, presidente do Movimento democrático Nacional [a designação é, de facto, Movimento Nacional Democrático (*)]. Numa entrevista à PÚBLICA em Março de 2008, Mesquita fala desse momento. “Quando fui preso a primeira vez fiz um comício no comboio. Eles meteram-me no comboio para Lisboa com dois pides. E eu comecei a conversar com as pessoas do lado, Até que, por fim, me levantei e disse: Meu amigos, chamo-me Arnaldo Mesquita, sou um preso político. Estes senhores são da PIDE e levam-me preso para Lisboa. A minha família não sabe. Por favor, avisem-na e avisem a Ordem dos Advogados. Dei a morada e, no dia a seguir, foram avisar”, contou na altura.»
[em Morreu Arnaldo Mesquita, o advogado defensor dos direitos dos presos políticos]
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